sábado, 6 de março de 2010

Semana Mário Sá-Carneiro" ( VI )


Mário de Sá-Carneiro, nasceu em Lisboa a 26 de Maio de 1890.
A Mãe morreu quando ele tinha apenas dois anos e, dois anos depois, quando ele tinha apenas quatro anos de idade, o pai iniciou uma vida de sucessivas viagens, deixando-o com os avós na Quinta da Vitória, em Camarate. Aos nove anos morreu a avó. No ano seguinte, começou a frequentar o Liceu do Carmo, tendo sido transferido em 1909 para o Liceu Camões. Começou a escrever poesia no tempo em que era aluno liceal. Entretanto, com o pai que regressara dos Estados Unidos, viajou até Paris, Suíça e Itália. Em 1911, entrou no curso de Direito da Universidade de Coimbra mas nem chegou a terminar o primeiro ano. Por essa altura terá iniciado a sua amizade com Fernando Pessoa. Seguiu depois para Paris, para estudar Direito na Sorbonne. Mas dedicou-se à vida boémia e ao convívio com os meios intelectuais e artísticos de Paris. Numa passagem por Lisboa, com Fernando Pessoa e outros amigos, fundou a revista “Orpheu” cujo primeiro número saiu em Abril de 1915. Logo depois regressou a Paris, onde se suicidou com vários frascos de estricnina em 26 de Abril de 1916. O sentido trágico da existência, a perda de uma grandeza quimérica perdida mas que sentira ao seu alcance e o drama da solidão, são os temas que atravessam a sua obra.

ÁLCOOL
 
Guilhotinas, pelouros e castelos
Resvalam longemente em procissão;
Volteiam-me crepúsculos amarelos,
Mordidos, doentios de roxidão.
 
Batem asas de auréola aos meus ouvidos,
Grifam-me sons de cor e de perfumes,
Ferem-me os olhos turbilhões de gumes,
Descem-me a alma, sangram-me os sentidos.
 
Respiro-me no ar que ao longe vem,
Da luz que me ilumina participo;
Quero reunir-me, e todo me dissipo ---
Luto, estrebucho... Em vão! Silvo pra além...
 
Corro em volta de mim sem me encontrar...
Tudo oscila e se abate como espuma...
Um disco de oiro surge a voltear...
Fecho os meus olhos com pavor da bruma...
 
Que droga foi a que me inoculei?
Ópio de inferno em vez de paraíso? ...
Que sortilégio a mim próprio lancei?
Como é que em dor genial eu me eternizo?
 
Nem ópio nem morfina. O que me ardeu,
Foi álcool mais raro e penetrante:
É só de mim que ando delirante …
Manhã tão forte que me anoiteceu.

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