segunda-feira, 1 de março de 2010

Semana "MÁRIO SÁ-CARNEIRO" ( I )


Mário de Sá-Carneiro, nasceu em Lisboa a 26 de Maio de 1890.
A Mãe morreu quando ele tinha apenas dois anos e, dois anos depois, quando ele tinha apenas quatro anos de idade, o pai iniciou uma vida de sucessivas viagens, deixando-o com os avós na Quinta da Vitória, em Camarate. Aos nove anos morreu a avó. No ano seguinte, começou a frequentar o Liceu do Carmo, tendo sido transferido em 1909 para o Liceu Camões. Começou a escrever poesia no tempo em que era aluno liceal. Entretanto, com o pai que regressara dos Estados Unidos, viajou até Paris, Suíça e Itália. Em 1911, entrou no curso de Direito da Universidade de Coimbra mas nem chegou a terminar o primeiro ano. Por essa altura terá iniciado a sua amizade com Fernando Pessoa. Seguiu depois para Paris, para estudar Direito na Sorbonne. Mas dedicou-se à vida boémia e ao convívio com os meios intelectuais e artísticos de Paris. Numa passagem por Lisboa, com Fernando Pessoa e outros amigos, fundou a revista “Orpheu” cujo primeiro número saiu em Abril de 1915. Logo depois regressou a Paris, onde se suicidou com vários frascos de estricnina em 26 de Abril de 1916. O sentido trágico da existência, a perda de uma grandeza quimérica perdida mas que sentira ao seu alcance e o drama da solidão, são os temas que atravessam a sua obra. 

QUASE

Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe d'asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...

Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num baixo mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...

Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!

De tudo houve um começo... e tudo errou...
- Ai a dor de ser, quase, dor sem fim... -
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se elançou mas não voou...

Momentos d'alma que desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...


Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...

Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...

Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
 

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