sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Tenho uma Saudade tão Braba



Tenho uma saudade tão braba
Da ilha onde já não moro,
Que em velho só bebo a baba
Do pouco pranto que choro.

Os meus parentes, com dó,
Bem que me querem levar,
Mas talvez que nem meu pó
Mereça a Deus lá ficar.

Enfim, só Nosso Senhor
Há-de decidir se posso
Morrer lá com esta dor,
A meio de um Padre Nosso.

Quando se diz «Seja feita»
Eu sentirei na garganta
A mão da Morte, direita
A este peito, que ainda canta.

Vitorino Nemésio, in "Caderno de Caligraphia e outros Poemas a Marga"



Vitorino Nemésio Mendes Pinheiro da Silva nasceu nos Açores (Ilha terceira) em 1901.
Em 1922 concluiu o liceu em Coimbra, ingressou na Faculdade de Direito. Em 1924 abandonou o curso de Direito e matriculou se na Faculdade de Letras, em Ciências Histórico-Geográficas. Em 1925 optou definitivamente pelo curso de Filologia Românica e foi nesse ano que surgiu o jornal "Humanidade" (quinzenário de Estudantes de Coimbra), tendo sido Nemésio o seu redactor principal. Nesse jornal colaboraram, entre outros, José Régio, João Gaspar Simões e António de Sousa. Em 1926, fundou e dirigiu com Paulo Quintela, Cal Brandão e Sílvio Lima, o jornal "Gente Nova" (jornal republicano académico) e a partir de 1928 passou a colaborar na revista "Seara Nova".
Foi um dos mais distintos e consagrados professores universitários do seu tempo, primeiro em Coimbra e depois em Lisboa. Como grande comunicador teve notáveis intervenções na rádio e na TV. Deixou uma extensa obra, do mais alto valor, como poeta, romancista e ensaísta. Colaborou em muitos jornais e revistas, tendo, desde a sua juventude, fundado várias publicações literárias. Entre outras línguas, as suas obras foram traduzidas em italiano, francês, inglês e alemão,.
 Vitorino Nemésio faleceu em Lisboa, em 1978, e foi sepultado em Coimbra.

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