terça-feira, 2 de novembro de 2010

AUTOPSICOGRAFIA

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Fernando Pessoa (1888 - 1935) - Nasceu e morreu em Lisboa. Passou uma parte da infância e da adolescência em Durban, na África do Sul. De regresso a Lisboa frequentou o Curso Superior de Letras que abandonou antes de terminar o 1º ano.
A sua genialidade como poeta coloca-o, para alguns, ao nível de Camões. Talvez baste dizer que era tão grande a sua genialidade que, não cabendo num único poeta ele inventou várias distintas personalidades para, através delas criar diferentes expressões da sua poesia. Concebeu 27 heterónimos, dos quais se destacam os três principais: Alberto Caeiro; Álvaro de Campos; Ricardo Reis.

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