terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

RONDEL DO ALENTEJO

Em minarete
mate
bate
leve
verde neve
minuete
de luar.

Meia-noite
do Segredo
no penedo
duma noite
de luar.

Olhos caros
de Morgada
enfeitada
com preparos
de luar.

Rompem fogo
pandeiretas
morenitas
bailam tetas
e bonitas,
bailam chitas
e jaquetas,
são as fitas
desafogo
de luar.

Voa o xaile
andorinha
pelo baile
e a vida doentinha
e a ermida
ao luar.

Laçarote
escarlate
de cocote
alegria
de Maria
la-ri-rate
em folia
de luar.

Giram pés
giram passos
girassóis
e os bonés,
e os braços
destes dois
giram laços
ao luar.

O colete
desta Virgem
endoidece
como o S
do foguete
em vertigem
de luar.

Em minarete
mate
bate
leve
verde neve
minuete
de luar.


(Escrito em 1913. Publicado in Contemporânea, Junho de 1922)

José Sobral de Almada Negreiros Nasceu na roça Saudade, ilha de S. Tomé, em 7 de Abril de 1893 e morreu em Lisboa no dia 15 de Junho de 1970. Personalidade multifacetada, quase sempre genial, mesmo quando resolve apenas divertir e, sobretudo, divertir-se como neste poema-cantilena, onde se recria em sonoridades e hábeis jogos de imagens. De qualquer modo - poeta, pintor, visionário, polémico, provocador, panfletário ou romancista - uma das mais curiosas personalidades da cultura portuguesa no século XX e um dos mais seguros e decisivos construtores do modernismo em Portugal.