quinta-feira, 10 de outubro de 2013

VERSOS D'AMAR ( II )

A Noite Suavemente Descia A noite
Suavemente descia;
E eu nos teus braços deitado
Até sonhei que morria.

E via
Goivos e cravos aos molhos;
Um Cristo crucificado;
Nos teus olhos,
Suavidade e frieza;
Damasco roxo, cinzento,
Rendas, veludos puídos,
Perfumes caros entornados,
  Rumor de vento em surdina,
Incenso, rezas, brocados;
Penumbra, sinos dobrando;
  Velasardendo;
Guitarras, soluços, pragas,
E eu... devagar morrendo.

O teu rosto moreninho,
Eu achei-o mais formoso,
Mas, sem lágrimas, enxuto;
E o teu corpo delgado,
O teu corpo gracioso,
Estava todo coberto de luto.

Depois, ansiosamente,
Procurei a tua boca,
A tua boca sadia;
Beijámo-nos doidamente...
- Era dia!

E os nossos corpos unidos,
Como corpos sem sentidos,
No chão rolaram... e assim ficaram!...

António Botto, in 'Canções'

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