quinta-feira, 9 de junho de 2011

Sonetos do Regresso



Volto contigo à terra da ilusão,
mas o lar de meus pais levou-o o vento
e se levou a pedra dos umbrais
o resto é esquecimento:
procurar o amor neste deserto
onde tudo me ensina a viver só
e a água do teu nome se desfaz
em sílabas de pó
é procurar a morte apenas,
o perfume daquelas
longínquas açucenas
abertas sobre o mundo como estrelas:
despenhar no meu sono de criança
inutilmente a chuva da lembrança.

II

Acordar, acender
o rápido lampejo
na água escusa onde rola submersa
como o lodo no Tejo
a vida informe, peso dúbio
desse cardume denso ou leve
que nasce em mim para morrer
no mar da noite breve;
dormir o pobre sono
dos barbitúricos piedosos
e acordar, acender
os tojos caudalosos
nesta areia lunar
ou, charcos, nunca mais voltar.

Carlos de Oliveira (1921-1981), in 'Cantata'

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