domingo, 25 de agosto de 2013

LEMBRAMOS AOS AMIGOS.

Olho os amigos como quem se despede,
uma vez por dia. Olho-os para que não os esqueça, 
para que se guardem as suas imagens dentro 
das pálpebras.

Hoje chove porque me esqueço aos poucos
de onde vieram. Termino o dia pensando neles,
nos amigos. 

E as suas palavras realçam-me as 
marcas que tenho pelo corpo, erguem-se
pelas mãos as suas vozes quando todos 
os outros se calam

falam como amigos. 

O corpo é uma febre conjunta - como que se
estendesse pela memória o desenho de um
país que se guarda na algibeira ao partir - e
continuo a partir daqui, onde os barcos viajam,
onde as gaivotas chilream

enquanto o sal se estende pelas minhas
narinas.

O vento alarga-me a roupa que se
moldou ao sabor dos dias. Penso no hoje e ele
raia-se pelo rio, surgem palavras de apreço
pelas luzes    pelas ruas 


e os amigos soltam-se de nós

Como uma prisão de espuma. São um momento
em que a fome se torna grande demais para os olhos,
onde tudo o que jaz à nossa volta é efémero

perduram como pequenas árvores em torno
de nós.

Devolvo-lhes um tempo de cada vez. Restítuo ao
que foram o peso das letras e dos campos - respirámos,
em espaços, o mesmo ar.

É quando se nos cresce um soluço pela garganta
que vemos - a chuva nada mais é que um som
- aí lembramos aos amigos o que somos


e porque os olho com o volume da despedida nas mãos.



Sérgio Xarepe

Sem comentários: